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A Diferença Básica entre Alan Parsons e Nós

(Ou A Síndrome de Jetson)





Ok, existem duas diferenças básicas. A primeira, e a mais óbvia, é que ele tinha o Pink Floyd de 1972 pra gravar , e nós não temos.


Mas se tirássemos o Pink Floyd de lá do Abbey Road e transferíssemos pro nosso estúdio hoje, a diferença fundamental é que hoje temos muito mais tecnologia à disposição. Podemos até extrapolar e dizer que possuímos muito mais “equipamento” que Parsons.

E Alan Parsons era um cara muito mais genial que nós? Bom, certamente ele é um engenheiro extremamente talentoso, um dos maiores da história, mas uma parte considerável de seu talento – e tempo – era gasto para vencer as dificuldades técnicas. Parsons era genial (entre outras coisas) por que tinha poucos recursos à disposição e sabia como usar so máximo o que tinha. Por exemplo, o delay de “Us and Them” não existia equipamento que fizesse, então ele gerou um loop de fita saindo do gravador , passando por um pedestal de microfone e voltando. Tinha que usar samples de relógios em “Time” ? Catava sons de relógios e montava fitas com gilete e fita adesiva. E mais um monte de coisas geniais, inteligentes e criativas.


A dificuldade é a mãe da criatividade. Sua qualidade (a de Parsons) vinha não só de sua excepcional capacidade técnica, mas também de sua habilidade em gerar soluções inéditas para os problemas, usando os recursos de que dispunha. Isso também é arte!


E esse é o contraponto do estúdio moderno. Temos um acesso praticamente infinito a recursos. Um monte de ferramentas, um monte de soluções esperando por problemas que acabam nunca vindo, porque está cada vez mais fácil gravar bem.


Talvez alguns se lembrem ( ou conheçam) um desenho dos anos 1960 – The Jetsons. Era uma família do futuro, e o pai (sim,a família era do futuro mas a estrutura social era a de família classe média americana de meados do século XX ) tinha um emprego que consistia na tarefa de apenas apertar um botão - e o equipamento obviamente tinha um nome sofisticado, tipo o que temos hoje: era o “Digital Index Operator” . Não precisava pensar. Era só apertar o botão e pronto: salário garantindo.


E aí o que provavelmente estamos criando hoje é um monte de Jetsons. Aparece um desafio e a primeira reação é “Que Plugin Resolve Isso?”. Já há algum tempo têm aparecido coisas do tipo “Mix Optimizer” , ou “Descobridor Automático de Conflitos de Frequência” , o que é de certa forma surpreendente, porque o melhor otimizador de mixagem é o mesmo “plugin” que descobre conflitos de frequências: o nosso cérebro!


Isso evidentemente revela um enorme saudosismo de minha parte, mas se posso dar uma sugestão que vai mudar seu jeito de resolver suas mixes é: ESQUEÇA OS PLUGINS POR UNS MINUTOS. Analise o que está acontecendo, ouça, pense! Você pode resolver 80% de uma mixagem apenas usando volumes e pan. Mais uns equalizadores aqui e ali e eventualmente uns compressorezinhos bem usados e praticamente tudo se resolve. O resto são os 20% artísticos que vão dar o seu charme particular. (Pareto hoje seria um belo mixador).


Evite a prática de pegar o seu template de soluções complicadas e sair usando antes mesmo de ouvir o áudio que você tem. Experimente pegar sua mix do zero, sem nada, só você e os faders, e tente domar esse touro bravo apenas com isso.


O que infelizmente acontece cada vez mais é: aparece um problema para o Jetson que existe em nós resolver – aí ele corre no youtube pra ver como alguém resolveu. Se não achar, corre no grupo e pergunta pros outros. Como em 99% dos casos vão lhe dizer pra usar os plugins X,Y e Z (juntos , de preferência, e cada um vai falar de um plugin diferente), ele então vai nos sites do lado negro da Força procurar versões piratas pra baixar. E depois ainda vai ter que aprender a usar as paradas – lembrando que a única coisa que Jetson sabe fazer é apertar botão sem pensar.


Enquanto Jetson fazia isso, Alan Parsons foi lá, ouviu, quebrou a cabeça, arranjou um jeito inteligente de resolver, resolveu, e saiu pra tomar um café.


P.S. – se você não tem a menor ideia de quem é Alan Parsons e o que ele fez em 1972, aí sim é hora de ir no Youtube pesquisar.

 
 
 

2 komentarze


Silvio Bitzki
Silvio Bitzki
08 mar 2022

O excesso de recursos digitais, o excesso de plug-ins, o excesso de opções, o excesso do excesso, do excesso..., ao invés de facilitar, acabam embaralhando nosso raciocínio e dificultando o discernimento e a tomada de decisões nas mais diversas etapas da mixagem. Como sempre, seu texto é ótimo! E a clareza com que você expõe suas ideias e a relevância dos temas abordados são a marca inequívoca do seu conhecimento sobre as questões relacionadas à produção musical. Parabéns Fabio!

Polub
Fabio Henriques
Fabio Henriques
09 mar 2022
Odpowiada osobie:

Obrigado, Silvio. É exatamente isso. Há 25 anos o problema era falta de informação. Hoje é o excesso.


Polub

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